Krak dos Cavaleiros

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Guardiães do Graal






A corrente acadêmica afirma que idéias ‘ocultistas’ sobre os templários são apenas tolice: a maioria dos historiadores atesta que eles eram apenas e tão-somente os monges-guerreiros que afirmavam ser, e qualquer insinuação que se faça de que eles estavam, mesmo que remotamente, envolvidos em qualquer coisa esotérica é resultado de fértil imaginação ou de pesquisa mal conduzida. Sendo isso um consenso, os historiadores que têm algum interesse nesse aspecto da Ordem não o demonstram abertamente por temerem perder suas reputações (e os fundos de pesquisa acadêmica). Tal tipo de pesquisa ou é evitada ou, se levada a cabo, permanece inédita. (Há vários historiadores de renome que reservadamente reconhecem que o aspecto esotérico dos templários é importante, mas nunca o dirão publicamente).
Essa atitude fez com que se negligenciasse o estudo de alguns locais importantes relacionados com os templários. E descobrimos que a região que foi a maior vítima desse fenômeno, a um grau que beira a mistificação, é a área de nosso maior interesse: o Languedoc-Roussillon. Sem contar a Terra Santa, essa era a pátria da Ordem. Mais de 30 por cento de todas as fortalezas e edificações templárias em toda a Europa ficavam nessa pequena região. Contudo, apenas um volume desprezível de trabalho arqueológico foi lá rea­lizado, e existem várias localizações importantes que não mereceram qualquer investigação.
Felizmente a negligência oficial é contrabalançada por muitos pesqui­sadores privados que têm um interesse apaixonado por esses misteriosos cavaleiros, e muitos dos moradores locais vêem como seu dever preservar e proteger os antigos locais relacionados com os templários. Há também vá­rios 'amadores' (no sentido de que eles não são bancados por fundos de pesqui­sa) e organizações de pesquisa, como o Centro de Estudos e Pesquisa dos Templários, dirigido por Georges Kiess, em Espéraza (Aude), de excelente qualidade. As descobertas feitas por esses entusiastas, através do estudo tan­to dos locais quanto dos muitos documentos relativos aos templários, que estão intactos e armazenados em arquivos locais, são impressionantes. Espe­cialmente dada a falta de recursos oficiais e a completa frustração de lidar com arquivistas apáticos.
Um desses grupos de pesquisa é o Abraxas, dirigido pelo britânico expatriado Nicole Dawe e pelo texano Charles Bywaters, na estância hidromineral de Rennes-les-Bains, Aude. Suas pesquisas, em conjunto com as da rede de grupos semelhantes, realizaram descobertas sólidas e documentadas que, literalmente, reescrevem os estudos dedicados aos templários. Nadando contra a maré da apatia oficial, por um lado, e, por outro lado, tentando con­trolar o entusiasmo extremo dos caçadores de tesouro locais, que represen­tam uma ameaça bastante real aos sítios arqueológicos de pesquisa, Nicole e Charles descobriram locais fundamentais relativos aos templários que, no entanto, nunca haviam sido tocados pelas pás dos arqueólogos. Grande parte de seus trabalhos ainda permanece inédito, embora eles planejem publicá-­los em um futuro próximo.
Portanto, se quisermos saber mais sobre a vida dos templários, nesse berço da heresia que é o Languedoc-Roussillon, não devemos procurar os centros acadêmicos, mas sim Charles e Nicole.
Sentados no apartamento de Charles em Rennes-les-Bains, localizado na rua principal (na verdade praticamente a única), começamos perguntan­do a ele e a Nicole sobre a possível conexão entre os templários e os cátaros.
. Eles responderam que havia claras ligações entre os dois grupos e que essas foram bem além de meros laços familiares, os quais eram geralmente negligenciados pelos historiadores. Por exemplo, até mesmo no auge da cruzada dos albigenses, os templários abrigaram cátaros fugitivos, e existem exem­plos documentados de que também prestaram socorro aos cavaleiros que abertamente lutaram ao lado dos cátaros contra os cruzados.
Como disse Nicole:

Você só precisa cruzar os sobrenomes cátaros dos documentos da Santa Inquisição com os nomes dos templários do mesmo período para perceber que são os mesmos. No entanto, mais particularmente, é inegável que algumas edificações dos templários alojaram, deram abrigo, e até mesmo enterraram os cátaros em chão sagrado.
Alguns têm sido cínicos a ponto de sugerir que isso ocorreu porque essas pessoas, a fim de se tornarem membros seculares do Templo, doaram-lhes todas as suas posses e bens. Na verdade, temos provas de cátaros que se socorreram junto aos templários depois de terem perdido completamente tudo o que possuíam, e não só foram recolhidos em determinados abrigos, como lá foram enterrados ao morrerem. Mais tarde, os templários algumas vezes faziam o que estivesse ao seu alcance para assegurar às família cátaras, ou a seus descendentes, que tivessem suas terras de volta.

Charles prosseguiu:

Em uma área em particular, os templários, claramente, permitiram que houvesse atividade hostil partindo de suas edificações. Os cavaleiros cátaros continuavam a lutar, e quando se retiravam seguiam para uma propriedade dos templários. Esses fatos estão fartamente documentados.

Isso representava algo bastante significativo para nós porque, dado que algumas das acusações levantadas contra os templários foram indubitavelmente forjadas, a única coisa não usada como evidência contra eles foi a íntima relação que mantinham com os cátaros desterrados. Que a Inquisição estava completamente ciente desse fato é revelado pelas escavações que fez nas propriedades templárias, desenterrando os corpos dos cátaros a fim de queimá-los e dessa forma intimidar outros possíveis hereges, mesmo já tendo se passado mais de trinta anos desde o final da Cruzada. (E foi a Inquisição que torturou os templários, portanto, se alguém sabia da con­exão destes com os cátaros, esse alguém era a própria Santa Inquisição.) Era óbvio que havia mais coisas acontecendo, talvez até mesmo algo que fosse do conhecimento da Coroa Francesa, mas era algo considerado tão perigoso se fosse tornado público que nem uma palavra sobre esse assunto veio à tona. Durante toda a nossa pesquisa sobre os templários tivemos o desconfortável - e crescente - sentimento de que algum segredo monumental estava à espreita, abaixo da superfície da história oficial. Poderia ser que os templários e os cátaros compartilhassem algum conhecimento potencialmente explosivo? E esse segredo poderia ter sido o real motivo de Filipe, o Belo, ter arquitetado essa muito bem planejada campanha contra os templários?
Nem todos os templários pereceram naquela sexta-feira fatídica do século XIII. Há muitos permitiu-se que vivessem e recomeçassem usando um outro nome. Dois países em particular ofereceram moradias seguras para os cavaleiros fugitivos, a Escócia e Portugal. (Neste último, os tem­plários tornaram-se conhecidos como os Cavaleiros de Cristo.) A região ao redor do Languedoc, aprendemos com Charles e Nicole, foi testemunha de uma curiosa exceção no padrão geral empregado na perseguição. Roussil­lon, parte leste da região, na verdade vivia sob proteção do reino espanhol de Aragon, enquanto o norte, que incluía Carcassonne, fazia parte da França. Os Templários de Roussilion foram presos, julgados e inocentados. Quando o Papa fechou oficialmente a Ordem, eles ou se juntaram a outras fraternidades semelhantes ou passaram o resto das vidas em suas terras, vivendo de pensão.
Como sugeriram vários comentadores, os templários sobreviveram à tentativa de exterminá-los totalmente e continuaram existindo até hoje em dia, embora haja evidências de que eles sofreram muitos cismas e operaram através de diferentes organizações, todas afirmando ser descendentes diretas da Ordem original.
Se os templários estivessem escondendo algo que fosse julgado extre­mamente perigoso pelo rei francês, a ponto de fazê-lo tomar uma ação drástica contra eles, o que poderia ser? Quem estava usando quem entre o Papa e Filipe? De qualquer ângulo que vejamos essa história, parece que um elo crucial está faltando.
Suponha que esse componente evasivo fosse do interesse do Monas­tério de Sion. Como já vimos, existem indicações de uma presença sombria por trás do próprio surgimento dos templários, e esse mesmo grupo de ma­nipuladores (quem quer que eles fossem) parecia dirigir as cenas conforme sua vontade. Charles e Nicole não têm nenhuma dúvida sobre a existência de um 'círculo secreto' organizado dentro da própria liderança dos templários, o qual ante datou o início oficial da Ordem. Eles assim prosseguem até o ponto de argumentar que o movimento templário fora criado para dar a esse círcu­lo secreto uma face pública, na mesma época em que a Terra Santa fora aber­ta aos viajantes europeus.
Outros pesquisadores também chegaram à mesma conclusão. Como o escritor francês Jean Robin (utilizando-se das pesquisas de Georges Cagger) afirma:

A Ordem do Templo constituía-se na verdade de sete círculos 'externos', dedicados aos mistérios secundários, e de três círculos 'internos', correspondendo à iniciação nos grandes mistérios. E o 'núcleo' era composto por aqueles setenta templários 'interrogados' por Clemente V [após terem sido presos em 1307].

De modo semelhante, no seu The Sign and the Seal, o autor britânico Graham Hancock escreve:

...A pesquisa que eu havia conduzido sobre as crenças e comportamentos desse estranho grupo de monges-guerreiros, convenceram-me de que eles haviam deparado com alguma tradição de sabedoria sumamente antiga...
Constituir um grupo interno secreto era algo bastante possível, pois os templários eram, essencialmente, uma escola de mistério, isso é; eles operavam como um sistema hierárquico que se baseava na iniciação e no segredo. É, portanto, bastante provável que não só os templários de patente rasa soubessem consideravelmente menos do que seus superiores, como que as crenças desses últimos fossem bastante diferentes. É provável que a maioria dos cavaleiros templários não fosse mais do que os simples soldados cristãos que aparentavam ser. O círculo secreto, porém, era algo muito diferente.
A razão da existência do círculo secreto dos templários parece ter sido a de acelerar o avanço das pesquisas sobre questões esotéricas e religiosas.
Talvez uma das razões para que se mantivessem em segredo fosse o fato de lidarem com aspectos enigmáticos relacionados aos mundos judeu e islâmico. Eles buscavam, literalmente, os segredos do universo, onde quer que suspei­tassem que poderiam ser encontrados, e em sua rota geográfica e intelectual de incessantes questionamentos talvez viessem a tolerar, e até mesmo a abraçar, algumas crenças não muito ortodoxas.
Naqueles dias, a busca incessante de conhecimento deve ter sido uma força motriz particularmente forte e irresistível. Os templários, porém, não se interessariam de vontade própria por essas complexas pesquisas, afinal eles eram pessoas intrinsecamente práticas. Quando seguiam uma linha de pesquisa em particular, era por uma razão muito boa e, por causa disso, deixaram certas pistas sobre o que realmente importava para eles.
Uma dessas pistas encontra-se nas obsessões de Bernard de Clairvaux, éminence grise (Eminência parda) dos templários. Esse ferino monge intelectual aparentemente devotava-se totalmente à Virgem Maria, como bem mostram muitos de seus sermões. No entanto, parece-nos que a Virgem não era objeto do verdadeiro amor espiritual de Bernard. Era uma Maria completamente diferente, cuja real identidade é sugerida pelo fato dele ter sido particularmente apaixona­do pelas Madonas Negras. Também chegou a escrever quase noventa ser­mões sobre o Cântico dos Cânticos, e pregou de modo muito mais explícito ligando a 'Noiva' a Maria de Betânia, que naquela época era inquestionavel­mente a própria Maria Madalena.
'Sou negra, mas graciosa', diz a amante, uma frase que também une o Cântico dos Cânticos ao culto das Madonas Negras, a quem Bernard (que nasceu em Fontaines perto de Dijon, lugar central do culto das Madonas Negras) era excepcionalmente dedicado. Ele afirmou ter recebido sua ins­piração como uma criança que recebe três gotas do leite milagroso do peito da Madona Negra de Chântillon. Especulou-se que isso era uma referência codificada à iniciação dele, Bernard, ao culto das Madonas. E quando Bernard rezou pela Segunda Cruzada, escolheu fazê-lo em Vézalay, centro fundamen­tal ao culto de Maria Madalena.
Então, é provável que a aparente devoção de Bernard para com a Virgem fosse simplesmente uma cortina de fumaça para sua verdadeira paixão por Madalena, embora, é claro, as duas não sejam mutuamente exclusivas. Contudo, ao criar a Regra dos Templários, Bernard recomendou que os cavaleiros prestassem 'obediência a Betânia e ao castelo de Maria e de Marta'. E ele é bem conhecido por ter repassado tal devoção particular à Ordem. Até mesmo em face da total extinção, os cavaleiros aprisionados com o Grão-Mestre Jacques de Molay, nas masmorras da fortaleza de Chinon, compuseram uma oração dedicada a 'Notre Dame' (Nossa Senhora) na qual mencionam São Bernardo como fundador da religião da Santificada Virgem Maria.  Em face, porém, de todas as outras evidências, essa também pode ter sido uma outra referência codificada ao culto de Madalena.
É bastante significativo que o juramento dos templários fosse a 'Deus e a Nossa Senhora', Ou com freqüência a 'Deus e a Santa Maria'. Alguns insinuam que a 'Nossa Senhora' do juramento não é a Virgem, o que é reforçado pelas palavras da Absolvição dos Templários: 'eu peço a Deus que perdoe os meus pecados, como perdoou os de Santa Maria Madalena e os do ladrão que foi pregado na cruz'. Isso pelo menos demonstra a importância de Madale­na para os templários. (É notável que no caso dos templários de Roussillon, durante seu cativeiro, as condições em que se encontravam fossem delib­erada e especificamente pioradas - por ordem do próprio Papa - no exato dia em que se comemorava Santa Maria Madalena. Lembremos que o massa­cre de Béziers também aconteceu no dia das festividades a Madalena para deixar bem claro a natureza da 'heresia'.)
Na realidade, os templários estavam preocupados com a idéia do Femi­nino como um todo, um conceito que pode parecer estar seriamente em conflito com sua imagem de guerreiros. Contudo, como Charles e Nicole descobriram, a Ordem do Templo incluía mulheres. Durante os primeiros anos de sua existência muitas mulheres fizeram o juramento da Ordem, em­bora tenham permanecido como membros seculares do Templo. Embora não haja nenhuma indicação de que havia um enclave de rainhas guerreiras den­tro da Ordem dos Templários, como afirmaram Michael Baigent e Richard Leigh em The Temple and the Lodge (1989):

... Um antigo relato do século XII, na Inglaterra, fala de uma mulher que é recebida no Templo como uma Irmã, e insinua de modo bastante claro haver algum tipo de ala ou anexo feminino na Ordem. Contudo, nenhuma elaboração ou esclarecimento foi encontrado sobre esse assunto. Mesmo tal informação, que poderia estar contida nos registros oficiais da Inquisição, já há muito tempo desapareceu ou foi suprimida.

Nicole e Charles, partindo de estudo profundo dos documentos dos templários, são bem mais enfáticos:

Se você voltar aos documentos do século XII, verá que há inúmeros exemplos de mulheres que haviam se juntado à Ordem, com certeza em seu primeiro século de existência. Qualquer pessoa que ingressasse na ordem deveria em juramento 'dar minha casa, minhas terras e meu corpo e alma à Ordem do Templo'. Você tem os nomes de mulheres no término desses documentos, assim como de homens também, e você tem com freqüência casais que ingressavam em conjunto e, portanto, as mulheres também deveriam fazer o juramento. Esses documentos são principalmente dessa região [o Languedoc], e existem muitos exemplos que demonstram que deve ter havido um número bastante grande de mulheres envolvidas em determinada época.

Os documentos também indicam que houve uma mudança posterior nas regras, naquelas que especificamente proibiam que os templários tivessem mulheres, ficando subentendido que até aquele momento eles haviam procedido em conformidade com a regra.
Quando expressamos nossa surpresa quanto a isso não ser mais ampla­mente conhecido, e certamente, tirando algumas vagas sugestões, o envolvi­mento das mulheres não aparecer nas obras comuns dedicadas aos templári­os, Charles explicou:

Às vezes parece que muitas dessas informações foram intencionalmente negligenciadas. O que você obtém nos livros é um punhado de informações redundantes, a mesma coisa repetida inúmeras vezes. Isso faz com que tenhamos apenas duas opções possíveis: ou essas pessoas são cegas ou por alguma razão muito específica elas não estão interessadas naquelas informações. Se você é um pesquisador, o que supostamente essas pessoas são, essas informações deveriam faze-­los saltar. Porém, elas nem sequer levam isso em consideração.

É notável que o arrastão geral de 13 de outubro de 1307 ocorresse sem derramamento de sangue. Por toda a França, os senescais do rei recebe­ram ordens lacradas que lhes ordenavam que organizassem tropas suficientes para prender os mais bem treinados guerreiros da cristandade, algo como uma delegacia de polícia receber ordens para prender tropas da Polícia do exército estacionadas na região.A maioria dos templários na França parece ter sido levada como cordeiros para o matadouro. É estranho que os cavaleiros não tenham pedido reforços de fora da França.
De modo significativo, alguns dos cavaleiros, inclusive o tesoureiro da Ordem, conseguiram escapulir, de um modo que indica que eles teriam sido avisados com antecedência. Além disso, a famosa frota dos templá­rios, fundeada na França, simplesmente desaparecera naquele momento. Em todos os registros das pilhagens dos templários pelo rei francês, não há um único navio listado. Onde a frota foi parar? Dificilmente teria desaparecido no ar.
O círculo secreto dos templários, porém, parece ter caminhado grandes distâncias a fim de preservar seu conhecimento secreto. Como o respeitado estudioso do Novo Testamento, Hugh Schonfield, demonstrou, os templários utilizaram um código conhecido como a Cifra de Atbash. Isso é algo verdadeiramente notável pois esse mesmo código havia sido usado pelos au­tores de alguns dos Manuscritos do Mar Morto mil anos antes da fundação da Ordem dos Templários. O que quer que isso signifique, por si só já revela que os templários eram peritos em manter seus segredos através dos mais engen­hosos meios, além de mostrar que seus conhecimentos vinham de fontes longínquas e esotéricas. Schonfield revela que, quando o código é aplicado ao nome do misterioso ídolo decapitado venerado pelos templários, Bapho­met, esse então se transforma na palavra grega Sophia. Graham Hancock es­creve, em The Sign and tbe Seal, que 'Sophia' significa nada mais nem menos que 'sabedoria' . Na realidade, porém, significa muito mais do que isso, e seu significado total acrescenta uma luz diferente a toda raison d'être dos tem­plários.
Citada significando simplesmente 'Sabedoria', em hebreu Chokmah, uma figura feminina que aparece no Antigo Testamento, especificamente no Livro dos Provérbios, Sophia tem causado muito embaraço entre os estudiosos judeus e cristãos porque é apresentada como sendo a parceira de Deus, a que exerce influência sobre ele e de fato o aconselha.
Sophia também era fundamental para a cosmologia gnóstica; na ver­dade, nos textos Pistis Sophia do Nag Hammadi, está intimamente associ­ada a Maria Madalena. E, assim como Chokmah, ela é a chave para se compreender o gnosticismo da Cabala (o importante e muito influente sistema esotérico que deu base para a magia do período medieval e do Renascimento). Para os gnósticos ela era a deusa grega Atenas e a deusa egípcia Ísis, que às vezes também era chamada de Sophia.
Tomado de forma isolada, é claro que o uso da palavra Sophia pelos templários, como a decodificação da palavra 'Baphomet', não revela qualquer reverência especial em relação ao mundo feminino. Eles podiam muito bem estar apenas reverenciando a busca da sabedoria. Entretanto, existem muitas outras indicações de que isso fazia parte de uma profunda obsessão em relação ao princípio feminino, que vai muito além de uma mera questão semântica, a ponto dos templários, e na verdade vários out­ros grupos esotéricos, estarem bastante interessados nessa questão.
Como nos diz o pesquisador escocês Niven Sinclair, cujo conheci­mento sobre os templários é particularmente extenso: 'Os templários decididamente acreditavam no poder feminino'. Niven não tem qualquer dúvida a esse respeito, e não há nada de estranho nisso.
Os templários habitualmente davam um formato circular a suas igre­jas, pois acreditavam que essa era a forma do Templo de Salomão. Por out­ro lado, isso pode ter simbolizado a idéia de um universo redondo, mas é mais provável que representasse o Feminino. Círculos e ciclos sempre es­tiveram associados às deusas e a tudo o que é feminino, seja esotérico ou biológico. É um símbolo arquetípico recorrente na história da civilização: as sepulturas da era pré-histórica eram montículos arredondados porque representavam o útero da mãe-terra, que tomaria de volta o defunto para que en­tão renascesse entre os espíritos. E todos nós estamos familiarizados com o arredondamento de uma barriga grávida, e com o símbolo da fase 'Mãe' das deusas, a lua cheia.
Qualquer que seja o significado preciso do formato circular para os templários, não há nenhuma dúvida de que esses sempre foram eminentemente masculinos. E após a época dos templários, a construção de igrejas em formato circular foi oficialmente considerada herética pela Igre­ja. Porém, como já notamos, a igreja francesa em Londres é redonda, uma característica que se repete e é reforçada por outros motivos decorativos, tanto internos quanto externos.
Os templários, parece, haviam acumulado conhecimento exótico e herético, mas isso foi acidental ou proposital? As evidências apontam para esta última hipótese: eles estavam em busca de certos segredos que, uma vez sob seu poder, lhes permitiriam optar entre aplicá-los ou retê-los. Uma vez que muitos de seus segredos ainda permaneciam sob sua guarda, os templári­os deixaram algumas pistas de alguns deles em forma de códigos, algumas até mesmo esculpidas em pedra.

Os cavaleiros templários eram a força motriz por trás da construção das grandes catedrais góticas, especialmente a de Chartres. Sendo os princi­pais, e com freqüência os únicos, 'desenvolvimentistas' nos grandes centros culturais europeus, também estavam por trás da formação das guildas de con­strutores, incluindo a de pedreiros, que se tornaram membros seculares da Ordem dos Templários, com vantagens que incluíam a isenção do pagamento de taxas.
Por toda a longa história das grandes catedrais, o estranho simbolismo dos motivos de decoração e do projeto confundiram peritos das mais diver­sas disciplinas. Foi apenas recentemente que tal simbolismo passou a ser visto como o que realmente era: a codificação do conhecimento esotérico dos templários. Graham Hancock, ao discutir a arquitetura sagrada dos anti­gos egípcios, nota que 'ela só foi igualada na Europa pelas grandes catedrais góticas da Idade Média, como a de Chartres', e coloca a seguinte questão: 'Terá sido mero acidente?' Hancock continua:

Já suspeitara há muito tempo que realmente tinha havido uma conexão e que os cavaleiros templários, através de suas descobertas durante as Cruzadas, poderiam ter formado o elo perdido na cadeia de transmissão dos conhecimentos arquitetônicos secretos... São Bernardo, o protetor dos templários, havia definido Deus, o que é inacreditável tratando-se de um cristão, como 'comprimento, altura, largura e profundidade'. Também não poderia deixar de lembrar que os próprios templários haviam sido grandes construtores e grandes arquitetos, ou que a ordem monástica dos cistercienses, a qual São Bernardo pertencera, também se superara nesse campo em particular da atividade humana.

O projeto das catedrais foi especificamente elaborado para levar em conta, para exemplificar, os princípios da geometria sagrada. É a idéia de que a proporção geométrica traz dentro de si uma ressonância da harmonia divina, e a de que algumas proporções em particular são mais divinas do que outras. É isso que está por trás da rude declaração de Pitágoras de que 'o número é tudo', e reforça o conceito hermético de que as matemáti­cas são o código através do qual os deuses falam com a humanidade. Os artistas e projetistas do Renascimento eram grandes adeptos dessa arquitetu­ra esotérica em particular, para quem a 'relação áurea' - para eles a pro­porção perfeita - era quase que uma panacéia universal. Porém, de modo algum se limitaram a essa aplicação, e o conceito da geometria sagrada per­meou todos os aspectos de suas vidas intelectuais. Os desenhos de Leonardo, sejam de homens ou de máquinas, o interior das flores ou o formato de uma onda, comunicava a convicção do artista de que havia significados nos padrões e harmonia nas proporções, e um de seus desenhos mais famosos, O Homem Vitruviano, literalmente incorpora a relação áurea.
O legendário Templo de Salomão era, para os templários e para os maçons, que vieram depois, a jóia da coroa e o melhor exemplar da geome­tria sagrada. Não apenas era uma suprema delícia para os olhos de qualquer um que o observasse ou rezasse dentro dele, como seu alcance ia muito além dos cinco sentidos. Foi pensado para ressonar, de um modo transcen­dental e sem igual, com a própria harmonia celestial; seu comprimento e largura, altura e profundidade estão completamente de acordo com as pro­porções mais adoradas pelo universo. O Templo de Salomão era, se você preferir, a própria alma de Deus escrita na rocha.
Muitos dos atuais visitantes ficam perplexos com os motivos, de clara natureza astrológica, gravados nas pedras das antigas catedrais. Com certeza, alguém hoje poderia chegar a pensar que o inconfundível símbolo de Áries esculpido na entrada principal de tão veneráveis edificações deve ser uma aberração, uma excentricidade pessoal de algum dos pedreiros. No entanto, em muitas catedrais diferentes esses sinais se repetem, e nunca de forma fortuita.
Todo o grandioso simbolismo encontrado nas catedrais era entendido pelos iniciados da época como um reflexo do antigo provérbio hermético: assim em cima, assim embaixo. Acreditava-se que a frase tivesse vindo da Tábua de Esmeralda, de Hermes Trismegistus, o lendário mágico, ou mago, egípcio, embora as palavras que a compõe possam ser muito mais antigas. Elas querem dizer que tudo o que há na terra tem uma contrapartida no céu e vice-versa, conceito que Platão tornou popular com sua noção do Mundo das Idéias. De acordo com isso, tudo o que existe, de uma colher até um homem, é somente uma versão de um modelo ideal que existe em algum tipo de dimensão alternativa, plena de modelos perfeitos. Os magos, ou magi, fo­ram mais adiante. Acreditavam que todo pensamento ou ato refletia-se em outro plano, e que ambas as dimensões afetavam uma à outra de um modo irresistível. Existem ressonâncias desse conceito na moderna idéia científica de universos paralelos, assim como nas histórias dos deuses antigos, com os seus ciúmes insignificantes e, com freqüência, sórdidas obsessões, que eram vistos como sendo os representantes arquetípicos da raça humana. Para nos­sos ancestrais, não havia nenhuma discrepância em prostrar-se humildemente perante o grande deus do Olimpo, Zeus, e ao mesmo tempo acreditar que ele, ocasionalmente, tomava a forma de um animal para seduzir as moças da Ter­ra. Era esperado de um deus que se comportasse como um homem, porém, o inverso desse conceito é a idéia, 'herética' para judeus e cristãos, de que um homem pudesse se tornar um deus.
Nada disso era novidade para os templários. O projeto das catedrais revela uma compreensão dos princípios herméticos por parte dos pedreiros, assim como dos cavaleiros que patrocinavam a construção. Eles, de todos os povos medievais, apreciavam especialmente a aplicação prática, onde quer que fosse possível, de todo e qualquer conhecimento esotérico. Para eles, a codificação das mensagens secretas nas próprias pedras das catedrais ia muito além de mera fantasia. Como Baigent e Leigh dizem no seu livro The Temple and the Lodge: Deus havia ensinado a aplicação prática da geometria sagrada através da arquitetura'.  E novamente nos vimos caminhando em direção ao Templo de Salomão.
Filho do legendário herói judeu, o Rei Davi, Salomão construiu um Tem­plo de profunda beleza, utilizando os melhores e mais caros materiais. Fo­ram usados mármores e pedras preciosas, madeiras aromáticas e os tecidos mais raros para criar um lugar que faria os sentidos dos veneradores flutuar em delícia, onde o próprio Deus se sentiria em casa. No centro de tudo ficava o mais sagrado dentre o sagrado, e aí o sacerdote poderia receber o Todo­Poderoso por meio do mais misterioso dos instrumentos, a Arca da Aliança. Esse dispositivo notoriamente temperamental era, por um lado, conhecido por conceder grandes bênçãos àqueles que eram 'virtuosos', mas, por outro lado, destruiria os malfeitores ou aqueles a quem não houvesse sido dito como combater os efeitos de sua presença maligna. Para os templários isso talvez se parecesse como a arma suprema, e, portanto, saíram em sua busca, con­forme alguns têm sugerido.
Talvez existam pistas daquilo que os templários realmente acreditavam ser o significado da 'Arca', presente nos motivos decorativos das catedrais. Por exemplo, a Catedral de Chartres, fruto da imaginação de sua éminence grise, Bernard de Clairvaux, contém uma escultura de pedra que parece ser a Virgem Maria, na qual está gravada a 'marca' arcis foederis: Arca da Aliança. Isso por si só não é muito significativo, pois esse era um símbolo cristão comum no período medieval. Mas como Chartres era um ponto central para o culto da Madona Negra, estaria a Arca sendo comparada com aquela outra Maria, a Madalena, ou até mesmo com uma deusa pagã muito mais antiga? Talvez seja o próprio princípio Feminino que esteja sendo evocado, utilizando-se, para despistar, o símbolo de Maria. Isso não pode ser uma referência à própria Virgem, pois os arquitetos da catedral gótica tin­ham uma razão especial para evocar o arquétipo de uma mulher sexualmente ativa. (É também significativo que as primeiras representações da lenda da vida de Maria Madalena na França estivessem nos vitrais da Cate­dral de Chartres.)
Na verdade, é a difamada e bem pouco compreendida alquimia que, com freqüência, está por trás dos motivos aparentemente bizarros das construções góticas (e era realmente a alquimia que aparentava ser o dado em comum entre a maioria dos Grão-Mestres do Monastério de Sion).
Acredita-se que a alquimia tenha sido transmitida pelo Egito antigo at­ravés dos árabes (a própria palavra, aliás, deriva do árabe). A alquimia signi­ficava mais do que ciência: a prática compreendia uma bem concatenada teia de atividades encadeadas e modos de pensar, da magia à química, da filosofia e hermetismo à geometria sagrada e à cosmologia.Também pesquisava o que hoje chamaríamos de engenharia genética, métodos para retardar o processo de envelhecimento, e a tentativa de conquistar a imortalidade física. Os alquimistas ansiavam por conhecimento e não tinham tempo a perder com antagonismos da Igreja contra as experimentações. Eles, então, se ocultaram e continuaram suas pesquisas secretamente. Para os alquimistas não existia tal coisa chamada heresia, enquanto que para a Igreja não existia um alquimista que não fosse herético; conseqüentemente, a prática da alquimia tornou-se conhecida como 'Magia Negra'.
A alquimia compreendia diversos níveis: o externo, ou esotérico, que se dirigia à manipulação e experimentação dos metais, mas havia outros níveis, muito mais secretos e que incluíam a realização da misteriosa 'Grande Obra'. Tal coisa era vista como o momento supremo da vida de um alquimista, quan­do então, finalmente, transforma-se metal comum em ouro. Nos círculos es­otéricos, porém, isso também é visto como o ponto em que a pessoa se torna espiritualmente iluminada e fisicamente revitalizada, através de um 'trabalho' de magia que gira em torno da sexualidade. (Discutiremos esse assunto em detalhes mais adiante.) Parece que a Grande Obra representava um ato de iniciação suprema.
Talvez se acreditasse que esse ritual fosse capaz de proporcionar a longevidade: existem rumores que afirmam que Nicolas Flamel, supostamente Grão-Mestre do Monastério de Sion, realizou a Grande Obra em companhia de sua mulher Perenelle, no dia 17 de janeiro de 1382, e que teria, após tal realização, vivido durante um tempo excepcionalmente longo.
Em alquimia, o símbolo para designar a consecução da Grande Obra é o hermafrodita, literalmente a junção do deus Hermes com a deusa Afrodite. Leonardo era fascinado pelos hermafroditas, chegando a ponto de preencher páginas e mais páginas com esboços destes, de um modo um tanto pornográ­fico. Um estudo recente sobre o retrato mais famoso do mundo, o maliciosa­mente enigmático sorriso de Mona Lisa, mostrou, de forma persuasiva, que 'ela' era ninguém mais ninguém menos que o próprio Leonardo. Os pesquisa­dores Dr. Digby Quested, do Hospital de Maudsley, em Londres, e Lillian Schwartz, dos Laboratórios Bell, nos E.U.A, utilizaram as mais sofisticadas téc­nicas de computação, independentemente um do outro, para sobrepor a face do retrato com a face do artista, e o resultado foi uma justaposição perfeita.Talvez essa fosse mais uma das inacreditáveis e inteligentes piadas que ele legou para a posteridade, mas há também a possibilidade de que Leonardo, sendo um alquimista, estivesse sumariando o fato de ter realizado a Grande Obra.
Alguns acreditam que tal feito poderia ocasionar uma transformação física tão profunda que o bem-sucedido alquimista poderia até mesmo ter mudado de sexo. Talvez fosse esse o conceito por trás da Mona Lisa. Mas o símbolo do hermafrodita também representa o momento do orgasmo, quan­do tanto o macho quanto a fêmea participantes do ritual são tomados pela sensação de união de um com o outro, de expansão dos próprios limites em direção a uma consciência mística de si mesmos e do universo.
As catedrais góticas ostentam muitas figuras curiosas, de demônios a Homens Verdes. Alguns, porém, ultrapassam o estranhamento: uma escultura na Catedral de Nantes mostra uma mulher olhando para um espelho, embora o reflexo seja, na verdade, o de um homem velho . E em Chartres a escultura da 'Rainha de Sabá', de fato, porta uma barba! Os símbolos alquímicos po­dem ser encontrados em muitas das catedrais associadas aos cavaleiros tem­plários.
Essas correlações são implícitas, mas Charles Bywaters e Nicole Dawe descobriram locais relacionados com os templários, no Languedoc-Roussillon, que continham um simbolismo alquímico explícito:

Nossa pesquisa mostrou, entre outras coisas, que eles estavam de alguma forma bastante familiarizados com as propriedades do solo. Em uma área em particular eles construíram um hospital para os templários que voltavam da Terra Santa, pois ali a terra tinha propriedades curativas. Existem símbolos alquímicos nesse local...
Fica bastante claro que estavam familiarizados com a alquimia. É significativo encontrar-se um local que fora especificamente escolhido em virtude da natureza da terra, onde existem evidentes símbolos alquímicos em sua estrutura e além de muitos elementos vinculados aos cátaros e aos muçulmanos. E essa evidência é consistente, documentada; é bastante fácil de ser provada.

Durante nossas viagens na França, repetidamente vimos que as ci­dades que haviam sido propriedade dos templários, como Utelle, na Pro­vença e Alet-les-Bains, no Languedoc, subseqüentemente haviam se tornado centros de alquimia. Também é significativo que os alquimistas, assim como os templários, reverenciassem a figura de João Batista de um modo espe­cia1.
Como já vimos, as grandes catedrais e muitas das igrejas mais famosas foram construídas em locais conhecidos por terem sidos consagrados a deusas antigas. Por exemplo, Notre-Dame, em Paris, erigiu-se sobre as fundações de um templo dedicado a Diana, e St Sulpice, em Paris, foi construída sobre as ruínas de um templo dedicado a Ísis. Tomado isoladamente esse ponto nada tem de incomum, pois por toda a parte na Europa foram construídas igrejas cristãs sobre antigos locais pagãos, como um movimento deliberado por parte da Igreja a fim de demonstrar que essa havia triunfado sobre os pagãos. Mas, com freqüência, o que na verdade acontecia era que os habitantes locais simplesmente adaptavam seus costumes pagãos ao cristianismo, e, então, viam o local da nova igreja como sendo complementar e não oposto à antiga Re­ligião. No entanto, em face dos evidentes interesses mais profundos dos tem­plários, não poderia ser que no caso das catedrais eles pretendessem dar continuidade à veneração do princípio feminino ao invés de suprimi-lo?Talvez as catedrais fossem hinos às deusas esculpidos na rocha. E 'Notre Dame', a quem tantos deles eram dedicados, era na verdade o próprio princípio femi­nino ou, Sophia...
A maioria das pessoas hoje pensa na arquitetura gótica como algo essencialmente 'masculino', com seus pináculos desafiando as alturas e naves em forma de cruz, mas a maior parte da decoração interna é intensamente feminina, especialmente as esplêndidas janelas em forma de rosa. Barbara G. Walker indica outros significados:

...A Rosa, que os antigos romanos conheciam como Flor de Vênus, [era] o distintivo das prostitutas sagradas. As coisas ditas 'debaixo da rosa' (sub rosa) eram parte dos mistérios sexuais de Vênus, que não seriam revelados aos não iniciados...

Na época áurea da construção das catedrais, quando Maria era ven­erada como uma Deusa em seu 'Palácio da Rainha Celestial', ou Notre-­Dame, ela foi com freqüência chamada de Rosa, Rosa-arbusto, Rosa-­guirlanda... Rosa mística... Assim como um templo pagão, a catedral gótica representava o corpo da Deusa que também era o universo, en­quanto continha a essência de divindade masculina dentro de si mesma...

A rosa, como veremos, também era um símbolo adotado pelos trova­dores, esses cantores de canções de amor do sul da França que estão intima­mente ligados com os mistérios eróticos.
Outros símbolos encontrados nas catedrais góticas portam potentes mensagens subliminares sobre o poder Feminino.As teias de aranha esculpi­das, uma imagem que se repete na cúpula em forma de clarabóia da igreja de Notre-Dame de France, em Londres, representa Arachne, a deusa-aranha que rege o destino do Homem, ou Ísis, no papel de tecelã dos destinos. Da mesma forma, o grande labirinto pintado no chão da Catedral de Chartres refere-se aos mistérios femininos, e através dele o iniciado só consegue encontrar o caminho se seguir o fio de linha fornecido pela deusa. Esse lugar, portanto, não foi planejado para ser palco de veneração da Virgem Maria, em particular porque também abriga uma Madona Negra, Notre Dame de Souterrain (Nossa Senhora do Subterrâneo). Em Chartres também há um vitral que descreve a chegada de barco de Madalena à França, combinando assim uma referência à lenda desta com a de Ísis, para quem os barcos tam­bém eram um meio de transporte predileto. (Talvez o Nautonnier, o timonei­ro, título do Grão-Mestre do Monastério, decorra de seu papel assumido no Navio de Ísis). Esse vitral é a mais antiga representação da lenda de Madale­na na França, e, em uma catedral há muitos quilômetros da Provença, foi considerado pelos arquitetos como sendo de grande significado.

Ao mesmo tempo em que as catedrais estavam sendo construídas, a heresia encontrava outra porta, desta feita assegurando-se de que sua men­sagem seria lembrada pela história, embora, como na Última Ceia, de Leo­nardo, as decodificações através das quais essas mensagens encontram ex­pressão sejam, com freqüência, marcadas pela pouca compreensão em relação ao que está realmente sendo dito. Essa outra tradição herética era a das len­das do Graal.
Hoje o termo 'Santo Graal' é freqüentemente utilizado com o significa­do de uma meta fugidia, o prêmio resplandecente que irá coroar o trabalho de toda uma vida. A maioria das pessoas percebe que isso está relacionado com algo mais antigo e religioso em sua natureza, e no geral com a taça em que Jesus bebeu na Última Ceia. Uma lenda conta que José de Arimatéia, o rico amigo de Jesus, nela coletou o sangue derramado na Crucificação, sangue em que foram encontradas propriedades curativas. A procura do Santo Graal é vista como uma busca repleta de perigos físicos e espirituais, em que aquele que procura tem que bater-se com as mais diversas espécies de inimigo, incluindo os do reino sobrenatural. Em todas as versões da história a taça é um objeto, literal e simbolicamente, da perfeição. Ela representa algo que per­tence a duas dimensões, a real e a mítica, e é capaz de cativar a imaginação como nenhuma outra coisa.
O Graal pode ser visto como um objeto misterioso, um tesouro verda­deiro que está em algum lugar de alguma caverna, mas que, entretanto, sem­pre carrega a idéia implícita de que simboliza algo inefável, muito além do mundo cotidiano. Essa aura de busca espiritual surgiu não só das lendas orig­inais do Graal, como também da cultura onde ela pela primeira vez apareceu.
Em nossa opinião, dentre as milhões de palavras que foram dedicadas a esse assunto no decorrer dos séculos, algumas das mais sábias podem ser encontradas no livro The Holy Grail de Malcolm Godwin, publicado em 1994. Esse livro é um sumário notável de todas as lendas e interpretações dispara­tadas, com a percepção de chegar diretamente ao cerne da matéria através da verbosidade dos estilos. Colocando de lado as habituais visões cristãs e celtas dos romances sobre o Graal dos séculos XII e XIII, Godwin também identifica uma outra visão igualmente importante, a alquímica. Ele revela que as versões mais antigas da história do Graal sem dúvida beberam nas fontes dos mitos celtas que permeiam os contos do grande herói Rei Artur e sua corte, e muitos dos elementos desses contos focalizavam os aspectos da veneração das divindades pelos celtas.As histórias do Graal redefinem as antigas lendas celtas e as estendem a fim de abarcar as idéias heréticas que estavam em voga no século XIII.
O primeiro dos romances sobre o Graal foi o inacabado Le Conte dei Graal (c.1190), de Chrétien de Troyes.A cidade de Troyes, de onde Chrétien tirou seu sobrenome, era um centro cabalístico e o local da preceptoria orig­inal dos templários, além de ser a cidade onde o Conde de Champagne esta­beleceu sua corte. (Na verdade, a maioria dos nove primeiros cavaleiros tem­plários eram vassalos deste.) A igreja mais famosa de Troyes é dedicada a Maria Madalena.
Na versão de Chrétien não há nenhuma menção de o Graal ser uma taça, nem há qualquer conexão explícita com a Última Ceia ou com Jesus Cristo. Na realidade, não há qualquer conotação religiosa, e já foi dito que sua ambientação original é claramente pagã. Aqui, no entanto, o Graal era uma bandeja ou prato, o que, como veremos, é algo bastante significativo. Na ver­dade, Chrétien se inspirou em um antigo conto celta no qual o herói Peredur, deveria, em sua busca, se deparar com uma procissão horripilante e aparentemente extremamente ritualística, em um castelo remoto. Sendo levada nessa procissão havia, entre outras coisas, uma lança que gotejava sangue e uma cabeça decapitada em uma bandeja. Uma característica co­mum nas histórias do Graal é aquele momento crítico em que o herói falha ao tentar formular uma pergunta importante, e é esse pecado de omissão que o coloca em grande perigo. Como diz Malcolm Godwin: 'Aqui, a pergunta que não é feita está relacionada com a natureza da cabeça. Se Peredur tivesse perguntado de quem era a cabeça, e que relação tinha com ele, ficaria saben­do como quebrar os encantamentos da Terra Devastada'. (A terra havia sido amaldiçoada e tornara-se infértil.)
Mesmo não tendo um fim, a história de Chrétien era de uma fuga bem­ sucedida que deu origem a uma série enorme de imitações, a maioria de caráter explicitamente cristão. Mas, como diz Malcolm Godwin, falando dos monges que lhe escreveram:

Eles manobraram a fim de esconder uma obra de profunda heresia dentro desse mistério piedoso, de modo que tanto a lenda quanto o autor sobreviveram ao zelo ígneo dos padres da Igreja. As mentes ortodoxas da Roma papal, embora nunca tivessem reconhecido, de fato, a existência do Graal, surpreendentemente se acovardavam em denunciar tal heresia... E é mais curioso ainda que a lenda sobrevivesse intacta ante a queda dos cátaros heréticos... e até mesmo a dos Cavaleiros Templários,que estavam claramente caracterizados em vários textos.

Uma dessas versões cristianizadas era Perlesvaus, que foi, segundo alguns, escrito por um monge na Abadia de Glastonbury, em 1205, enquanto que para outros essa é uma obra de um templário anônimo.Esse conto, na verdade, fala sobre duas buscas que estão entrelaçadas. O Cavaleiro Gawain procura a espada que decapitou João Batista, a qual magicamente sangra diariamente ao meio-dia. Em um episódio o herói encontra uma car­roça que continha 150 cabeças decapitadas de cavaleiros: algumas estavam marcadas com ouro, algumas com prata e outras com chumbo. E há tam­bém uma estranha donzela que carrega em uma das mãos a cabeça de um rei, marcada com prata, e na outra a de uma rainha, selada com chumbo.
Em Perlesvaus os servos de elite do Graal usavam artigos de vestuário brancos com seu brasão gravado, uma cruz vermelha, exatamente como os templários.Também há uma cruz vermelha que estava em uma floresta, e que se tornou um grande tormento para um dos padres, pois esse bateu nela 'em todas as partes' com uma vara, um episódio que tem uma clara con­exão com a acusação de que os templários haviam batido e pisoteado na cruz. E, mais uma vez, há uma cena curiosa que envolve cabeças decapitadas. Um dos guardiães do Graal diz ao herói, Percival, 'Existem as cabeças marca­das em prata, cabeças marcadas em chumbo, e os corpos a quem essas ca­beças pertencem: eu digo o que você tem que fazer, vá lá e pegue as cabeças do Rei e da Rainha'.
O simbolismo alquímico é pródigo: metais preciosos e comuns, reis e rainhas.Tal imaginário também é encontrado em abundância em outra grande obra reescrita sobre a lenda do Graal, como ainda veremos.
Apesar da tácita aversão da Igreja para com o Graal, a versão mais cristianizada foi escrita por uma equipe de monges cistercienses. Denominada Queste del san Graal, é notável pelo fato de utilizar-se do Cântico dos Cânti­cos para compor seu poderoso simbolismo místico.
De todas as bastante estranhas histórias do Graal a mais estranha e mais provocante de todas foi Parzival, do poeta bávaro Wolfram van Eschen­bach (1220). Nela o autor declara estar deliberadamente corrigindo a versão de Chrétien de Troyes, que não contém toda a informação disponível. Ele afirma que sua história é a mais precisa porque ele conseguiu a verdadeira história com um Kyot, da Provença, que foi identificado como Guiot de Provins, um monge que tanto falava pelos templários como cantava como um trova­dor. Como Wolfram escreve em Parzival: 'O conto autêntico com a con­clusão para o romance foi enviado da Provença para as terras alemãs.
Mas qual era essa conclusão? Em Parzival o Castelo do Graal é um lugar secreto, vigiado pelos templários - que Wolfram chama de os 'homens batizados', o que é bastante significativo -, que são enviados para espalhar sua fé em segredo. O sigilo absoluto e a aversão da Companhia do Graal em ser interrogada são pontos bastante realçados.
No final da história Repanse de Schoye (a portadora do Graal) e o meio-irmão de Parzival, Fierefiz, partem para a Índia e têm um filho chama­do João, o famoso Prester João, que é o primeiro de uma linhagem que sempre recebe o nome de João... Seria essa uma referência codificada ao Monastério de Sion, cujos Grão-Mestres, supostamente, recebem esse mesmo nome?
O conceito de linhagem é fundamental para as teorias relativas ao Graal de Baigent, Leigh e Lincoln. Como o título do primeiro livro deixa claro, para eles o 'Santo Graal' era de fato o 'Santo Sangue'. Isso se baseia na idéia de que o original francês sangraal, que é comumente entendido como san graal (Santo Graal), deveria ter sua leitura corrigida para sang real, o sangue real, que para eles significa uma linhagem sangüínea hereditária. Baigent, Leigh e Lincoln conectam a ênfase dada à linhagem nas lendas do Graal com o que eles acreditam ser o grande segredo relacionado a Jesus e a Madalena, que teriam sido marido e mulher, e propõe sua própria teoria: o Graal das lendas era uma referência simbólica aos descendentes de Jesus e Maria Madalena. De acordo com essa teoria, os guardiães do Graal eram aqueles que conhe­ciam essa linhagem sagrada secreta, como, por exemplo, os templários e o Monastério de Sion.
Entretanto, existe um problema com essa idéia: nas histórias do Graal a ênfase está na linhagem dos guardiães do Graal e na dos descobridores do Graal: o próprio Graal é o que os está separando. Embora fosse bem possível que as lendas se referissem à guarda de um segredo mantido por certas famílias, e que foi passado de geração para geração, parece improvável que eles real­mente estivessem aludindo a uma linhagem sangüínea. Afinal, quando a idéia passou a ser cogitada, ela veio à tona na forma de uma única palavra francesa sangraal, e, como já vimos, existem sérias dificuldades em uma hipótese que se alicerça na idéia de continuidade de uma 'linhagem sangüínea pura' at­ravés dos tempos.
A ligação entre as histórias do Graal e o legado dos templários parece ser verdadeira o suficiente. Wolfram von Eschenbach é crível por ter viajado bastante e por conhecer os centros templários do Oriente Médio, e por seu conto ser, de longe, o mais explicitamente templário de todos os romances sobre o Graal. Como diz Malcohn Godwin: 'Ao longo de Parzival Wolfram entremeia seu relato com discussões sobre a astrologia, a alquimia, a cabala e as novas idéias espirituais do Oriente. Ele inclui também um óbvio simbolis­mo que nos remete diretamente ao Tarô.
É nessa versão que os Guardiães do Graal no Castelo Montsalvasch são explicitamente chamados de templários. O castelo original foi identificado como sendo o de Montségur, a última das grandes fortalezas dos cátaros. A narrativa, em um outro poema de Wolfram, invoca o Senhor do Graal do Cas­telo de Perilla. O verdadeiro Senhor de Montségur à época do poeta era Ram­on de Perella. Mais uma vez encontramos uma ligação entre templários e cátaros, entre si e com um indefinido, porém extremamente valioso tesouro.
Não há qualquer taça dotada de poderes sobrenaturais na versão de Wolfram; aqui o Graal é uma pedra, lapsit exillis, que provavelmente significa a Pedra da Morte, embora isso seja mera especulação. Ninguém sabe real­mente. Outras explicações afirmam que a pedra era uma jóia que se soltou da coroa de Lúcifer quando este decaiu do céu para a terra, ou que é a famosa Pedra Filosofal (lapis elixir) dos alquimistas. Dentro do contexto, essa última interpretação é a mais provável: o texto todo é farto em simbolismo alquími­co.
Alguns escritores viram a personagem Cundrie, a 'mensageira do Graal' em Parzival, como sendo a representação de Maria Madalena. (Certamente Wagner assim o fez: em sua ópera Parsifal (1882), sua Kundry possui um frasco de 'bálsamo' e lava os pés do herói, e então, como se fosse Madalena, seca-os com os próprios cabelos.) Talvez haja alguma ressonância da taça do Graal na jarra de alabastro que Madalena carrega na tradicional iconografia cristã.
Em todas as histórias, porém, a busca do Graal é uma alegoria para uma viagem espiritual do herói em direção - e para além - da transformação pes­soal. E como já vimos, um dos principais motivos de toda alquimia séria era exatamente esse. Mas foi apenas esse subtexto alquímico que fez com que todas as lendas de Graal fossem 'heréticas'?
A Igreja, sem dúvida, sentia-se mortalmente ofendida pelo fato de as histórias do Graal ignorarem ou absterem-se de afirmar sua autoridade e a sucessão apostólica. O herói age por si só, embora ocasionalmente receba ajuda, em busca de esclarecimento espiritual e transformação. Assim, em essência, as lendas do Graal são textos gnósticos que enfatizam a responsabi­lidade do indivíduo para com o estágio de evolução de sua própria alma.
Porém, existem muito mais coisas capazes de ofender a sensibilidade da Igreja que estão implícitas em todas as histórias do Graal. Pois a busca do Graal é, inevitavelmente, apresentada como sendo reservada apenas para os iniciados do mais alto grau, a nata da elite, algo que está muito além até mes­mo da transcendência da missa. Além disso, em todas as histórias do Graal, o próprio objeto, qualquer que seja ele, é guardado por mulheres. Até mesmo na história celta de Peredur os jovens até podem portar uma lança, mas são as damas que levam o que podemos chamar de protótipo do Graal, a bandeja com a cabeça. Mas como poderiam as mulheres realizar um papel de autori­dade em algo que era efetivamente uma forma mais sublime de Missa? (Lem­bremos que os cátaros, cuja fortaleza de Montségur era quase com certeza o original para o Castelo do Graal de Wolfram, mantinham um sistema de igual­dade sexual, de forma que homens e mulheres poderiam ser chamados de 'padres' .)
No entanto, é a conexão com os templários que é mais difundida nas histórias do Graal. Como vários comentadores apontaram, a acusação de que os cavaleiros adoravam uma cabeça decapitada, que se acreditava ser a de Baphomet, tem ressonâncias com os romances de Graal nos quais, como já vimos, as cabeças decapitadas aparecem em toda parte. Os templários fo­ram acusados de atribuir a esse Baphomet poderes semelhantes aos do Graal: ele poderia fazer com que as árvores florescessem e a terra se tornasse fértil. Na verdade, os templários não só foram acusados de idolatrar essa cabeça, como também mantinham em seu poder um relicário de prata, na forma de um crânio feminino, no qual estava gravado simplesmente caput (cabeça).
Hugh Schonfield, ao considerar as implicações relacionadas a essa ca­beça feminina, juntamente com sua 'interpretação' da palavra Baphomet como significando Sopbia, escreve:

Parece haver pouca dúvida de que a bela cabeça feminina dos templários representasse Sophia em seu aspecto feminino, assim como também Ísis, e ela estava conectada com Maria Madalena na interpretação cristã.

As relíquias dos templários também têm a reputação de incluírem o (suposto) dedo indicador de João Batista. Isso pode ser bem mais significa­tivo do que parece à primeira vista. Como nós vimos no Capítulo I, Leonardo com freqüência retratou alguns personagens em cenas religiosas que delib­erada e ritualisticamente colocavam em riste seu dedo indicador, e esse ges­to parece estar conectado com João Batista. Por exemplo, vimos como um indivíduo que parecia estar venerando uma alfarrobeira em A Adoração dos Reis Magos estava fazendo esse gesto: tanto a árvore quanto o gesto estão relacionados a João. A relíquia que afirmam ter pertencido aos templários pode ter sido a razão material que fez com que Leonardo adotasse tal ima­gem.
(Jacobus de Voragine em seu livro Golden Legend narra uma tradição que diz que o dedo de João Batista, a única parte do cadáver sem cabeça que escapou da destruição ordenada pelo Imperador Juliano, foi trazido para a França por Santa Thecla, e então, talvez possa haver alguma razão para se acreditar que a relíquia dos templários e aquela da lenda sejam a mesma. E de Voragine também registra a lenda que conta que a cabeça do Batista foi enter­rada debaixo do Templo de Herodes, em Jerusalém, onde os templários escavaram.)
Os templários são constantemente vinculados ao Graal. A escritora via­jante britânica Nina Epton descreve, em seu livro The Valley of Pyrene (1955), como ela escalou até as ruínas do castelo de Montréal-de-Sos, dos templários, no Ariège, para ver os murais que retratam uma lança com três gotas de sangue e um cálice, uma imagem que foi, claramente, tomada diretamente das lendas do Graal.
Outra pintura estranha foi encontrada no castelo em Domme, onde muitos templários foram presos. Ean e Deike Begg descrevem uma estranha cena da Crucificação na qual José de Arimatéia (segurando uma cruz de Lorraine) é mostrado, à direita, colhendo gotas do sangue de Jesus. À esquer­da está uma mulher grávida e nua que segura uma vara ou um bastão.
Existem outras ligações ainda mais curiosas. Em St-Martin-du-Vésuvie, na Provença, que, como vimos, é um centro renomado de Madonas Negras e de locais associados aos templários, há uma lenda que incorpora elementos interessantes das histórias do Graal. Afirma-se que os templários foram todos decapitados durante sua supressão - algo que, dada a falta completa de verificação oficial, parece ser extremamente improvável - e que eles amal­diçoaram a terra com mangra. Os homens ficariam impotentes ou estéreis e a terra infértil. Qualquer que seja a verdade sobre esse assunto, é um fato históri­co que em 1560 o Duque Emmanuel Filibert de Savoy mandou exorcizar a terra, pois essa se encontrava em um estado lastimável. Na verdade, um dos cumes das redondezas ainda é conhecido como Maledia (que pode ser traduz­ido como 'doença'). Mas a parte mais significativa desse conto pesaroso é a que vincula a decapitação dos templários com a mangra espalhada na terra, dois dos principais elementos do cânone do Graal. Para os escritores de históri­as do Graal havia algo sobre as cabeças decapitadas, ou talvez a cabeça de­capitada, que havia trazido a destruição da terra, embora também pudesse representar uma dádiva àqueles a quem ela favorecesse.
As diferentes histórias do Graal e as várias correntes existentes podem parecer algo confusas, mas em seu monumental estudo sobre as lendas do Santo Graal, Tbe Hidden Church of the Holy Grail (1902), o grande erudito do ocultismo, A.E.Waite, destacou a presença de uma tradição secreta dentro do cristianismo, que estava por trás de todo o conceito das lendas. Waite foi um dos primeiros a reconhecer os elementos alquímicos, herméticos e gnós­ticos dessas histórias. Embora estivesse certo de que existem fortes indícios sobre a existência dessa 'igreja oculta' das lendas do Graal, ele não chega a qualquer conclusão realmente firme sobre sua natureza, mas dá uma posição proeminente àquilo que chamou de 'Tradição Joanina' . Ele se refere a uma idéia há muito defendida em círculos esotéricos de uma escola mística de cristianismo que fora fundada por João, o Evangelista, baseado nos ensina­mentos secretos que recebera de Jesus. Esse conhecimento enigmático não aparece no cristianismo externo, ou esotérico, que se desenvolveu através dos ensinamentos de Pedro. É bastante significativo que Waite achasse que essa tradição chegara à Europa através de Gaul, no sul de França, antes de ter sido filtrada pela recente Igreja Celta da Bretanha.
Apesar dos elementos celtas nas histórias do Graal, Waite entende que a influência joanina nelas presente origina-se no Oriente Médio, via templários. Astutamente, ele não afirma que essa é a única conexão possível, pois não há evidência conclusiva para isso, mas acredita que essa é a mais plausível. Porém, ele tem certeza de que os romances do Graal baseavam-se em algum tipo de 'igreja oculta' que estava ligada aos templários.
A ênfase de Waite em uma 'tradição joanina' era um tanto tantalizante; ele não elaborou o suficiente tal assunto, e suas fontes permanecem miste­riosas. Mas parece que isso poderia propiciar uma potencialmente explosiva ligação entre as histórias do Graal e um determinado São João que, como veremos no próximo capítulo, daria sentido a grande parte da aparente confusão que envolve esse assunto.
As histórias do Graal também são uma outra manifestação das idéias nascidas no submundo, que estavam circulando na França medieval sob os auspícios dos templários, como o culto das Madonas Negras.A conexão entre os dois é impressionante. Ambos baseiam-se em antigos temas pagãos: as histórias do Graal em mitos celtas e o culto das Madonas Negras em santuá­rios dedicados a deusas pagãs.Ambos floresceram nos séculos XII e XIII devido ao contato, através dos templários, com a Terra Santa.
Os templários eram um repositório do conhecimento de diversas fon­tes esotéricas, incluindo a alquimia e a sexualidade sagrada. A conexão entre as Madonas Negras, templários e alquimia é assunto de um estudo do histori­ador francês Jacques Huynen, chamado L'enigme des Vierges Noires (O Enig­ma das Virgens Negras, 1972.) E a 'ponte' entre suas idéias exóticas e esotéri­cas e o mundo cristão de sua época estava personificado na imagem de uma mulher: Maria Madalena.
Tudo isso aconteceu há muito tempo atrás. Os cátaros já há muito se foram, e a Ordem dos Templários se foi logo depois. Mas estará esse conhecimento secreto, essa consciência mística e alquímica do Feminino, tam­bém enterrada debaixo do pó de todos esses séculos?
Talvez não. Talvez isso tenha se tornado o mais excitante, e o mais per­igoso, segredo mantido vivo no submundo da Europa atual.

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